Total de visualizações de página

sábado, 23 de março de 2019

Grande Desejo (Adélia Prado)

Não sou matrona, mãe dos Gracos, Cornélia,
sou é mulher do povo, mãe de filhos, Adélia.
Faço comida e como.
Aos domingos bato o osso no prato pra chamar o cachorro
e atirar os restos.
Quando dói, grito ao,
quando é bom, fico bruta,
as sensibilidades sem governo.
Mas tenho meus prantos,
claridades atrás do meu estômago humilde
e fortíssima voz para cânticos de festa.
Quando escrever o livro com meu nome
e o nome que eu vou pôr nele, vou com ele a uma igreja,
a uma lápide, a um descampado,
para chorar, chorar, e chorar,
requintada e esquisita como uma dama.

Adélia Prado, Bagagem, 1976

Nenhum comentário:

Postar um comentário