"Meu caro companheiro", disse Sherlock Holmes [...] "a vida é infinitamente mais estranha do que tudo que a mente humana seria capaz de inventar. Não ousaríamos conceber coisas que, na realidade, não passam de lugares-comuns da existência. Se pudéssemos sair voando de mãos dadas por aquela janela, pairar sobre esta grande cidade, remover suavemente os telhados e espreitar as esquisitices que estão acontecendo, as estranhas coincidências, as maquinações, os quiproquós, os maravilhosos encadeamentos de fatos, que atravessam gerações e conduzem aos resultados estapafúrdios, toda a ficção, com suas convenções e conclusões previsíveis, pareceria extremamente batida e inútil."
Arthur Conan Doyle - "As Aventuras de Sherlock Holmes", Conto "Um caso de identidade" [1891]
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domingo, 26 de julho de 2020
sexta-feira, 3 de julho de 2020
A Peste - Albert Camus (1947)
"Em Orã, porém, os excessos do clima, a importância dos negócios, a insignificância do cenário, a rapidez do crepúsculo e a qualidade dos prazeres, tudo exige boa saúde. Lá o doente fica muito só. O que dizer então daquele que vai morrer, apanhado na armadilha por detrás das paredes crepitantes de calor, enquanto, no mesmo minuto, toda uma população, ao telefone ou nos cafés, fala de câmbio, de notas fiscais ou de descontos?" (p.11)
"A palavra “peste” acabava de ser pronunciada pela primeira vez.[...]. Os flagelos, na verdade, são uma coisa comum, mas é difícil acreditar neles quando se abatem sobre nós. Houve no mundo tantas pestes quanto guerras. E contudo, as pestes, como as guerras, encontram sempre as pessoas igualmente desprevenidas. [...] Quando estoura uma guerra, as pessoas dizem: “Não vai durar muito, seria idiota”. E sem dúvida uma guerra é uma tolice, o que não a impede de durar. A tolice insiste sempre, e nós a compreenderíamos se não pensássemos sempre em nós. Nossos concidadãos, a esse respeito, eram como todo mundo: pensavam em si próprios. [...] Nossos concidadãos não eram mais culpados que os outros. Apenas se esqueciam de ser modestos e pensavam que tudo ainda era possível para eles, o que pressupunha que os flagelos eram impossíveis. Continuavam a fazer negócios, preparavam viagens e tinham opiniões. Como poderiam ter pensado na peste, que suprime o futuro, os deslocamentos e as discussões?" (p. 40).
"“E assim, encalhados a meia distância entre esses abismos e esses cumes, mais flutuavam que viviam, abandonados a dias sem rumo e recordações estéreis, sombras errantes, incapazes de se fortalecerem a não ser aceitando enraizar-se na terra de sua própria dor.”
A Peste - Albert Camus (1947)
"A palavra “peste” acabava de ser pronunciada pela primeira vez.[...]. Os flagelos, na verdade, são uma coisa comum, mas é difícil acreditar neles quando se abatem sobre nós. Houve no mundo tantas pestes quanto guerras. E contudo, as pestes, como as guerras, encontram sempre as pessoas igualmente desprevenidas. [...] Quando estoura uma guerra, as pessoas dizem: “Não vai durar muito, seria idiota”. E sem dúvida uma guerra é uma tolice, o que não a impede de durar. A tolice insiste sempre, e nós a compreenderíamos se não pensássemos sempre em nós. Nossos concidadãos, a esse respeito, eram como todo mundo: pensavam em si próprios. [...] Nossos concidadãos não eram mais culpados que os outros. Apenas se esqueciam de ser modestos e pensavam que tudo ainda era possível para eles, o que pressupunha que os flagelos eram impossíveis. Continuavam a fazer negócios, preparavam viagens e tinham opiniões. Como poderiam ter pensado na peste, que suprime o futuro, os deslocamentos e as discussões?" (p. 40).
"“E assim, encalhados a meia distância entre esses abismos e esses cumes, mais flutuavam que viviam, abandonados a dias sem rumo e recordações estéreis, sombras errantes, incapazes de se fortalecerem a não ser aceitando enraizar-se na terra de sua própria dor.”
A Peste - Albert Camus (1947)
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sexta-feira, 22 de maio de 2020
Brecha
"Sempre existe uma brecha entre a norma e o vivido, o dogma e a crença, as normas e as condutas. Nessa brecha, se insinuam as reformulações, os desvios, as apropriações, as resistências".
Roger Chartier, A História ou a Leitura do Tempo (2007, p. 47)
Roger Chartier, A História ou a Leitura do Tempo (2007, p. 47)
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terça-feira, 28 de abril de 2020
Escada ou jogos de dados?
“A humanidade
em progresso em nada se parece com um personagem subindo uma escada, acrescentando
por cada um de seus movimentos um novo degrau a todos os outros que já tivesse
conquistado; evoca antes o jogador, cuja chance está divida em muitos dados e
que, cada vez que os lança, os vê se espalharem no pano, ocasionando contas bem
diferentes. O que se ganha num lance se arrisca a perder no outro (...)”
Lévi-Strauss, "Raça e História", 1952, (p.343).
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quarta-feira, 22 de abril de 2020
"O mundo subjacente: um conjunto de relatos, recordações, imagens, cheiros, sonhos, aversões, inquietudes, posições corporais e espirituais, maneiras de ser e pensar que herdamos ao mesmo tempo que o nome e o dia do nosso nascimento. Um país obscuro ou luminoso, uma terra provedora ou dolorosa feita de lendas familiares peneiradas pela memória social e pela história nacional, da qual podemos ter vontade de nos emancipar mais tarde, mas que, até lá, são a própria intimidade."
Emmanuelle Loyer, Lévi-Strauss, 2018 (p.25)
Emmanuelle Loyer, Lévi-Strauss, 2018 (p.25)
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Possível fim de um casamento
Eu tenho que ficar bem, apesar de você.
No futuro sem você, eu terei que ficar bem, apesar de mim.
No futuro sem você, eu terei que ficar bem, apesar de mim.
sábado, 18 de abril de 2020
"A biografia, portanto, seria o lugar onde as articulações entre coerções e liberdades, entre determinações sociais e posicionamento dos atores, entre o nascimento de um pensamento 'genial' sem dúvida, mas também a base coletiva desse desapontar, são suscetíveis de aparecer em sua textura delicada e trançada, à imagem das cestarias indígenas que Lévi-Strauss gostava de desenhar em seus cadernos de expedições."
Emmanuelle Loyer, Lévi-Strauss, 2018
Emmanuelle Loyer, Lévi-Strauss, 2018
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sábado, 22 de fevereiro de 2020
Angústia, 1936
"Certos lugares que me davam prazer tornaram-se odiosos. Passo diante de uma livraria, olho com desgosto as vitrinas, tenho a impressão de que se acham ali pessoas exibindo títulos e preços nos rostos, vendendo-se."
Angústia, Graciliano Ramos, 1936
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