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segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Se eu fosse...

Se eu fosse cineasta, teceria imagens ensolaradas e melancólicas, enchendo histórias mínimas de esperança.
Se eu fosse mulher, seria simples e forte, mas um pouco insegura.
Se eu fosse cão, não abanaria o rabo para qualquer um.
Se eu fosse velho, faria de tudo para não ser ressentido.
Se eu fosse Deus, reescreveria certos pedaços da história.
Se eu fosse escritora, encheria páginas de frases nubladas e tristes, e não mostraria a ninguém.

Personalidade

A gente é até deixar de ser.

Maternidade e feminismo

Uma certa angústia no peito. Sentimento não raro para Madalena, mas naquele dia, ao acordar, sabia exatamente o motivo do desconforto. Por um lado, ela tinha muita vontade de participar do grupo de discussão de filosofia que ocorreria naquela tarde na universidade. Por outro lado, ela não queria, e não podia, deixar seu bebê de dois meses que ainda mamava no peito a cada duas horas. Como ela faria então?
Madalena sempre é acometida por dilemas aparentemente bobos como esse. Mas não é por ser aparentemente bobo que seja de fácil resolução. Como conciliar internamente a pretensão de ser uma mãe presente e dedicada com a vontade de ser uma profissional qualificada e atualizada? Essa dúvida, entretanto, não acometeu ocasionalmente Madelena naquela triste manhã chuvosa e fria de segunda-feira. Tal dilema se fazia recorrentemente presente entre as mães "modernas".

Madalena, não fique triste.
Madalena, seu bebê sorri para você, você sorri para ele, e vocês dois sabem.
Madalena, a vida provavelmente é uma só e tudo vai passar tão rápido e vai haver tempo e você poderá fazer tantas coisas, é só não ter medo.
Madalena, ser mãe é ser forte.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Presepe - Manuel Bandeira

Chorava o menino.

Para a mãe, coitada,
Jesus pequenito,
De qualquer maneira
(Mães o sabem...), era
Das entranhas dela
O fruto bendito.
José, seu marido
Ah esse aceitava,
Carpinteiro simples,
O que Deus mandava.
Conhecia o filho
A que vinha neste
Mundo tão bonito,
Tão mal habitado?
Não que ele temesse
O humano flagício:
O fel e o vinagre,
Escárnios, açoites,
O lenho nos ombros,
A lança na ilharga,
A morte na cruz.
Mais do que tudo isso
O amedrontaria
A dor de ser homem,
O horror de ser homem,
- Esse bicho estranho
Que desarrazoa
Muito presumido
De sua razão;
- Esse bicho estranho
Que se agita em vão;
Que tudo deseja
Sabendo que tudo
É o mesmo que nada;
- Esse bicho estranho
Que tortura os que ama;
Que até mata, estúpido,
Ao seu semelhante
No ilusivo intento
De fazer o bem!
Os anjos cantavam
Que o menino viera
Para redimir
O homem - essa absurda
Imagem de Deus!
Mas o jumentinho,
Tão manso e calado
Naquele inefável,
Divino momento,
Ele bem sabia
Que inútil seria
Todo o sofrimento
No Sinédrio, no horto,
Nos cravos da cruz;
Que inútil seria
O fel e vinagre
Do bestial flagício;
Ele bem sabia
Que seria inútil
O maior milagre;
Que inútil seria
Todo sacrifício...


Manuel Bandeira, livro Belo, Belo - 1949

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Maitena II

Leminski II

das coisas
que eu fiz a metro
todos saberão
quantos quilômetros
são

aquelas
em centímetros
sentimentos mínimos
ímpetos infinitos
não?

Leminski I

sossegue coração
ainda não é agora
a confusão prossegue
sonhos a fora

calma calma
logo mais a gente goza
perto do osso
a carne é mais gostosa

domingo, 7 de agosto de 2011

To Zion - Lauryn Hill

Unsure of what the balance held
i touched my belly overwhelmed
by what i had been chosen to perform
but then an angel came on day
told me to kneel down and pray
for unto me a man child would be born
woe this crazy circumstance
i knew his life deserved a chance
but everybody told me to be smart
look at your career they said
"Lauryn baby use your head"
but instead i choose to use my heart
Now the joy of my world is in Zion
now the joy of my world is in Zion
how beautiful if nothing more
than to wait at Zion's door
i've never been in love like this before
now let me pray to keep you from
the perils that surely come
see life for you my prince has just begun
and i thank you for choosing me
to come through unto life to be
a beautiful reflection of his grace
see I know that a gift so great
is only one god could create and
i'm reminded everytime i see your face
that the joy of my world is in Zion
now the joy of my world is in Zion
marching marching marching, Zion
marching marching
marching marching marching to Zion
beautiful beautiful Zion.



segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Melancolia ao entardecer

Quieta, um pouco assustada, aguardo o meu bebê chegar.
Estou ansiosa por conhecê-lo. Penso nele com amor, carinho, ternura - sentimentos nobres. Claro, não estou livre de tantos medos e ansiedades, mas de maneira geral, acho que estou pronta para recebê-lo em meus braços nos próximos dias com muito amor.
O que me angustia, portanto, é o de sempre. Uma sensação de solidão, um pouco de inveja dos outros que em seus Facebooks possuem tantos amigos e festas e redes de sociabilidade. E trabalho, produção intelectual em artigos e congressos e tudo parece mais bem resolvido.

Eu, eu tenho a mim mesma, tenho o meu bebê, tenho o meu marido e tenho a minha família (pai, madrasta, irmã, avó e cachorra).
Fora isso, tenho apenas parcelas totalmente incompletas de experiências sociais: amigos, trabalhos, esportes, política, interesses. Tudo quase, tudo meio, tudo pouco.

Eu queria ser diferente, mas sou assim. E isso me torna um pouquinho triste.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Vida do bebê II

Quando nascer, o bebê será da família. Depois criança, jovem, adulto, será dono de si mesmo, será de suas paixões, será dos seus amigos, será da vida e será da morte.

Por enquanto, ele é meu.

[Janeiro de 2011]

Vida do bebê

Um bebê dentro da barriga não tem sexo, não tem religião, não tem preferência política, não tem culpa nem mágoas. Não tem vaidade.
O bebê tem vida.
E tem o apoio incondicional da mãe que o cria.
Dentro da barriga, o bebê não tem medo, nem tempo.
Tem é muita vida. A vida verdadeira, a vida pura. É forte, é corajoso, é decidido. Mas isso não são qualidades, nem virtudes, nem valores. São a sua condição de se manter vivo. Para além dele próprio, para além de mim, que o fabrico e o hospedo.
Se eu ficar deitada, sem fazer nada por agora, com preguiça, ele vive do mesmo jeito. O mérito da vida não é nem dele, nem meu. É a vida mesmo que é assim, independente.
O bebê está para mim como estou para ele. Merecemos o mesmo. E nos amamos sem sentimentalismos.

Que lindo que deve ser, ter vida e não ter personalidade. Aproveite bem bebê, porque depois nos tornamos chatos.

Janeiro de 2011

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Clarice III

"Um domingo de tarde sozinha em casa dobrei-me em dois para a frente - como em dores do parto - e vi que a menina em mim estava morrendo. Nunca esquecerei esse domingo. Para cicatrizar levou dias. E eis-me aqui. Dura, silenciosa, heróica. Sem menina dentro de mim."

Clarice Lispector, A Descoberta do Mundo




[Ler Clarice era como um perdão...]


quarta-feira, 27 de abril de 2011

Mexendo

O bebê mexe dentro da minha barriga.
Onde vamos, vamos juntos, e eu o amo também por causa disso.
O bebê mexe comigo.

domingo, 24 de abril de 2011

Primeiro cabelo branco

É um cabelo grosso e acinzentando, como deveria ser, bem no meio da cabeça.
Olho bem no espelho diante do susto, procuro mais algum sinal, vejo então que os olhos já tem duas ruguinhas de cada lado. Sinto um desespero e um certo orgulho diante dessas evidências, e penso: terei que enfrentar essa situação tão séria e banal como todo mundo, universalmente, a enfrenta.
E sei que para as mulheres a questão é ainda mais complexa...
Tento me imaginar daqui a dez anos, quando todos esses pequenos sinais estarão mais acentuados. Vem à minha mente a imagem de outras mulheres que conheço, lindas, bem mais velhas do que eu. Também para elas, e para todas as outras, isso sem dúvida, em algum momento, foi uma questão permeada por certa angústia diante de um espelho bem iluminado. E, no entanto, estão aí, como se sempre tivessem tido 50 anos.

A gente envelhece todos os dias.

De pouquinho em pouquinho.

E isso, na verdade, é bom.

Bom porque não é de repente, não é que um dia você acorda e sua cara já não é mais a mesma. Bom, porque ela nunca foi a mesma. Criança, adolescente, jovenzinha, mulher feita, mulher madura, uma senhora, uma velhinha. Todos os dias, um rosto diferente. Desde sempre.

Bom porque o tempo, ao invés de ficar parado, anda. E ao invés de fazer isso silenciosamente, vai nos mostrando "estou andando e, olha, você está mudando junto comigo", "caminhamos lado a lado, todos os dias", ele vai explicando pra gente. Assim, ele permite que a gente também siga nessa linha, só que vivendo.

E a vida, por mais dura que possa nos parecer às vezes, é a única oportunidade segura que nós temos de pensar, sentir, agir, amar e mudar. E isso, em si e sem mais explicações, só pode ser bom.


quinta-feira, 21 de abril de 2011

Lady Laura - Roberto Carlos

Tenho às vezes vontade de ser
Novamente um menino
E na hora do meu desespero
Gritar por você
Te pedir que me abrace
E me leve de volta pra casa
E me conte uma história bonita
E me faça dormir
Só queria ouvir sua voz
Me dizendo sorrindo
Aproveite o seu tempo
Você ainda é um menino
Apesar de distância e do tempo
Eu não posso esconder
Tudo isso eu às vezes preciso escutar de você
Lady Laura, me leve pra casa
Lady Laura, me conta uma história
Lady Laura, me faça dormir
Lady Laura
Quantas vezes me sinto perdido
No meio da noite
Com problemas e angústias
Que só gente grande é que tem
Me afagando os cabelos
Você certamente diria
Amanhã de manhã você vai se sair muito bem
Quando eu era criança
Podia chorar nos seus braços
E ouvir tanta coisa bonita
Na minha aflição
Nos momentos alegres
Sentado ao seu lado, eu sorria
E, nas horas difíceis
Podia apertar sua mão
Lady Laura, me leve pra casa
Lady Laura, me conta uma história
Lady Laura, me faça dormir
Lady Laura
Tenho às vezes vontade de ser
Novamente um menino
Muito embora você sempre acha que eu ainda sou
Toda vez que eu te abraço e te beijo
Sem nada dizer
Você diz tudo que eu preciso
Escutar de você....

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Fases

A vida é feita de fases.
Acho que a minha pode ser divida assim:
1) Nascimento à infância (mais ou menos 12 anos): uma criança quase feliz, apesar dos traumas. Sozinha?
2) Adolescência 1: incorporando os controles. Conflitos e amizades na escola. Uma menina bonita.
3) Adolescência 2: questionando os controles. Experiências, bebidas, drogas, vida. Desespero e alegria. Cicatrizes e aprendizados.
4) Adulta 1: conquistando a liberdade: aprendi a trabalhar, a ser responsável, a dar valor para a vida caseira. Ao mesmo tempo, me senti sozinha e desesperada, precisei de ajuda.
5) Adulta 2: casamento. Medo de ser sozinha, paixão, esperança, libertação pela experiência a dois. Tédio, insatisfação, plenitude. Constituí um lar.
6) Adulto 3: Grávida. Se perco o bebê nesse momento, mudarei a minha vida. Se o tenho, mudarei muito mais. Quero ser mais forte e mais ativa em relação a mim mesma. Liberdade apesar dos compromissos. Será possível?

(apagarei isso logo)

Síntese psicanalítica

O medo de decepcionar o pai.
O medo de parecer-se com a mãe.
E vice-versa.


Son unos inútiles

Penso assim para me sentir diferente deles.

Quero é servir aos humildes, aqueles que sentem na existência o que sinto no espírito, como no bom e velho cristianismo.
Quero é trabalhar com disciplina, redimir-me pela ordem e pelo método exteriormente estimulados, como no protestantismo.
Quero é silenciar meu grito interior, aprender a existir sem lutar o tempo todo com o desejo incessante, como no budismo.

Sinto-me religiosa. É a maneira, feito esperança, que encontro nesse momento de reformular a angústia e a frustração que sinto por minha vida ser como é. Praticamente inútil.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Enjôo(s)

As unhas vermelhas da réporter na televisão, o cheiro acre de madeira e sei lá mais do que que exala do escritório, a consistência do creme de espinafre, o bafo da cachorra, meus seios inchados, as páginas tantas vezes acessadas na internet, a solidão diante do computador, as vitaminas grandes e rosadas, presunto amanhecido, o saco de lixo antes de ser amarrado, uma ligação inesperada, restos de comidas no ralinho da pia, roupa usada mais de uma vez, bifes grandes... ... ...

Tudo isso, e muito mais, nesse momento, me dá enjôos. Os chamo de enjôos ocasionados pela gestação. Poderiam ter outro nome, não?
Alguém subitamente entra em minha casa e me encontra deitada no chão da sala.
- O que você está fazendo ai?
Eu responderia:
- Estou sobrevivendo.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Ginecológica

Mãe (avó)
 -
Filha (mãe) (ego)
-
Filha (filha)

Borboleta

  
                       Mulher grávida é como

                                  a linha

                       que une dois espelhos

                                   .